quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

♥ Lições Por Trás das Grades



Lições Por Trás das Grades
Aprendi muito com nossos 'hamsters'
Por Kathleen Gibson


   A história abaixo foi deixada como mensagem por minha mãe, em uma noite familiar, aqui em casa. Foi tirada da Revista "Seleções", edição Outubro de 2001, páginas 115-117. Ela é marcante pra mim por dois motivos em especial: Primeiro, por minha família e eu já termos tido 3 hamsters de estimação em casa, sendo assim, me identifiquei com os fatos contados, até mesmo o local de enterro dos nossos bichinhos  é exatamente o mesmo que a autora conta que foram com os dela; Segundo, por mostrar que, até em coisas aparentemente simples, há na verdade, um profundo significado e oportunidade de aprendizado, mesmo em se tratando de hamsters, que para muitos, é apenas um animalzinho que passa parte do tempo 'girando em uma rodinha' para queimar suas calorias.
Homenagem a nossos três Hamsters que já vieram a falecer: [Lizst, Elise (Lise) e Gordão (Ou, para alguns: Lizst II)].


A História:


   Quando eu estava na 4ª série, a professora precisou dar um lar a Mimi, a Hamster da sala de aula, e meus pais foram os únicos que concordaram. Mimi acabou sendo a primeira de uma longa sucessão desses minúsculos roedores - primeiro, meus; depois, de meus filhos.
   Agora mesmo uma está dormindo sobre o piano, aninhada na cama de cedro perfumado por trás das grades azuis da gaiola. Meus alunos de música capricham nas escalas, muitos na esperança de acordá-la, mas, além dos dois olhos escuros e brilhantes e do nariz cor-de-rosa sempre a tremer, não conseguem ver muito dela. E há pouco mesmo para se ver: o equivalente a duas colheres de sopa cheias. Ela é um hamster siberiano que ganhei de meu filho de 19 anos, ocupado demais para atender às poucas necessidades do animalzinho.
   Ele a chamava de Rob, mas para mim ela é Petite Sonatine Chantée Dolce Vivace. Traduzindo: pequena canção cantada com doçura e rapidez. Tina, para encurtar. É provável que seja nossa última, pois os meninos planejam sair de casa em breve. Vou então aproveitar a companhia dela. Seu ninho vai preencher um canto vazio do meu.
   Nem sempre foi fácil ter hamsters. Não demorei a aprender a identificar o choro de quando uma das crianças abria a gaiola para dar um olá e encontrava o bichinho rígido e frio. Com o tempo, elas vieram a aceitar a tristeza da morte dos amigos como um preço a ser pago pelo prazer de sua companhia.
   'Hamsy' (o primeiro) era excepcional em todos os sentidos. Curioso e dócil, recebia as visitas com uma inspeção cuidadosa e a pata delicada estendida entre as grades. Era especialista em roer os fios torcidos que prendiam a porta e depois sair correndo em busca de liberdade. Três dias foi seu recorde. Já tínhamos desistido de procurá-lo, quando descobrimos que ele estava vivendo no armário sob a pia do banheiro. O lugar estava tomado por páginas rasgadas de catálogos de lojas, migalhas de torrada, pedaços de fraldas, ervilhas secas e uma reluzente bola de gude azul.
   Ele voltou para a gaiola de bom grado e deixamos que ficasse com a bola de gude. Não foi preciso imaginar como ele transportara o objeto. Hamsy era um devorados de amendoins. Uma vez, ficamos observando enquanto enchia as bochechas com seis deles, inteiros. Depois da fuga e da recaptura, ele passou a se balançar pendurado no alto da gaiola, como um macaco, primeiro para pegar os amendoins que deixávamos ali, depois por simples prazer.
   Quando hamsy morreu, realizamos um funeral. Preparamos o pequeno caixão e enterramos o  corpo atrás da igreja. Meu marido fez as preces e os meninos não tentaram esconder a tristeza. O menor não ficou nem um pouco consolado com as palavras de agradecimento do pai pela curta vida do animal.
   Na semana seguinte compramos Hamsy II, e essa passou a ser a regra. Toda vez que um hamster morria, fosse pela idade avançada, por doença ou ainda com uma pequena colaboração do cachorro, comprávamos outro. Calculo que eu tenha convivido com uns 20 hamsters nas últimas décadas. Durante esse tempo, já os considerei desde criaturas adoráveis e inteligente até diabólicas pragas noturnas. Hoje, entretanto, detenho-me para examinar como suas breves e radiantes vidas inspiraram a minha.
   Com eles aprendi que pequeno não quer dizer estúpido, e que bonitinho nem sempre significa bonzinho. Também descobri que as vidas curtas às vezes são as mais doces, que a liberdade tem um preço alto e que armazenar mais do que se utiliza resulta em desperdício desnecessário.
   Agora entendo que há momentos em que estar enclausurado é preferível às alternativas, mas que, se uma porta se abre, é melhor ser rápido e agir. Compreendi que um salto arriscado pode nos fazer aterrissar em mandíbulas ferozes, mas também que quem nada arrisca, nada alcança. Percebi que a liberdade sem fronteiras traz infortúnios e que é possível transformar inimigos em amigos.
   A cada semana, esses animais me fizeram ver que, quando nossa casa é destruída, é melhor começar a reconstrução de imediato, com fervor e dedicação. Noite após noite, ensinaram-me que temos mais sucesso em nossas tarefas quando todos estão dormindo. Também me mostraram que, embora a vida possa ser um moinho, isso não significa que devamos parar de correr, e que o moinho pára se decidirmos saltar dele.
   Quando tento subir na vida cada vez mais alto e mais rápido, visualizo a gaiola dos hamsters e lembro que às vezes escadas são apenas escadas, e que andar depressa não serve de nada se não temos aonde ir.
   Mais importante ainda: descobri que, quando a vida ergue à nossa volta, podemos aprender a nos balançar nelas.


Ilustração Central: GENEVIÈRE LUSSIER.